“Estamos em pleno mar...”
Castro Alves
Um dos primeiros romances que li na vida foi a história de Moby Dick, a baleia branca. Tudo bem, “li” é maneira de dizer. Não lembro se ganhei de presente ou era um livro que pertencia a meu pai, o fato é que eu não saia de perto do livro e nem o livro saia de perto de mim. Era uma dessas edições grandes, como essa agora da “Cosac Naif” cheia de ilustrações e uma capa com uma baleia branca descomunal quase destroçando um pequeno bote. Cada vez que lia um bocado, eu voltava para a capa e quase recomeçava o livro de novo de tão fascinado.
Como já disse, era uma edição ilustrada, cheia de mapas, rotas marítimas, animais marinhos e muitas baleias. De todas as formas. Também cenas de caçadas implacáveis, homens e seus arpões em botes mínimos contra verdadeiros monstros. Parecia um livro infinito. Lembro de ficar pasmo com a quantidade de histórias e personagens interessantes descritos ali e ao mesmo tempo, todas elas pareciam falar de um homem apenas. Ahab, o capitão. O capitão da alma.
“Sou o senhor do meu destino,
Sou o capitão de minha alma!”
Moby Dick arrancou a perna de Ahab, durante uma caçada. Agora, Moby Dick precisa morrer. É a mania de Ahab. A bordo do Pequod, conduzido durante três anos por uma tripulação formada por renegados, náufragos, canibais, um índio, um negro, o jovem Ishmael e três esplêndidos imediatos, e com a coisa toda envolta em praticidade e loucura. A indústria americana? O navio, símbolo do nosso mundo civilizado? O navio da alma de um americano? O que é então Moby Dick ? O mais profundo sangue da raça humana, nossa mais profunda natureza sanguínea, o mal que habita em todos nós? Fustigam as velas e o escritor D.H. Lawrence em um belo ensaio sobre o livro.
Meu segundo encontro com Moby Dick foi no cinema. O filme de John Huston com Gregory Peck no papel de Ahab e roteiro de Ray Bradbury selou minha relação de amor por este livro para sempre. Mais tarde, na galeria de “monstros de minha infância”, Moby Dick se diluiria um pouco, com a chegada de King Kong, Tubarão e...Conan, o bárbaro.
Ontem fui ver a adaptação teatral de Moby Dick dirigida por Aderbal Freire-Filho. Atores excelentes, dramaturgia idem e eu ali, mais uma vez embarcado em uma nova e ao mesmo tempo antiga viagem. E mais uma vez a baleia venceu. Fui engolido por ela. Feito Jonas, a tripulação do Pequod e o público ali presente.
Chego em casa e, mais uma vez, abro Moby Dick no início e leio sua primeira frase: “Trate-me por Ishmael.” Ou por “H”, pensei.
2 comentários:
Gosto tanto da forma como escreve...Tanto...
Li, anos atrás, que Moby Dick tinha sido banido dos curriculos escolares americanos pelo de seu teor "politicamente incorreto". O mundo anda muito ordinário.
Vou ver a peça.
Como tantos textos que leio aqui, tenho sempre a mesma expressão: Antológico. belo, curto, vasto.
H. escreve pra carai...
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