domingo, 19 de julho de 2009

LEITURAS - II

“- Agora vai dizer em voz alta, e sem pensar, tudo que lhe vier à cabeça. Relaxe o mais possível e nada de escrúpulo.

- Escrúpulo. Cabeça. O oceano é azul. Que calor está fazendo. A morte de Danton. As metamorfoses de Ovídio. O senhor é uma besta. Com quantos paus se faz uma canoa? Vinte e um, vinte e dois, vinte e três, vinte e quatro. As laranjas da Califórnia são deliciosas. Umbigo. Rapadura. Otorrinolaringologista. É a tua, mulher nua, vou pra Lua, jumento, pára-vento, dez por cento, Catão, catatau, catapulta que o pariu, catástrofre, caralho, os medos, os vegas, as vegaminas, as sulfas e as para-sulfas, diametilaminatetrasulfátosódico, porra de merda, argentino, argentário, argentículo, testículo, laparotomia, Boris Karloff, Irmãos Karamazov, Irmãos Marx, Marx, Engels, Lenin, Lenita, onomatopéia, onomatopaico, onanista, ovos de Páscoa, jerimum, malacacheta, salsaparrilha, Rzhwpsykj, Celeste Império, semicúpio, Salazar, sai azar, seis e vinte da manhã, Dadá, Dedé, Dodô, Dudu, holofote, oliveira, olá Olavo, Alá, ali, alô sua besta já não basta?…

- Basta.

O sábio agora me olhava atentamente, o lápis suspenso no ar, o bloco de papel com rascunhos sobre o joelho. Sua máscara traia uma grande inquietação, como se temesse alguma coisa ou já começasse a por em dúvida a minha sanidade. Até que, simulando uma calma absoluta, arriscou com o ar mais natural deste mundo:

- O senhor já foi à Bulgária?”

Campos de Carvalho – O Púcaro Búlgaro

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