segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Uma tarde na Modern Sound



Calçadão de Copacabana. Era um dia quente. Eu fumava um cigarro e meu amigo também. Andamos até a loja de suco para fazer um lanche. Começamos a conversar sobre um filme recente que lembrava um filme dos anos 80.

"Rocco!" Gritou um italiano do outro lado da rua, acenando para um amigo. Como eu sabia que era um italiano? A cidade está cheia deles. A cidade está cheia de estrangeiros. Grupos de todos os tipos. Italianos, chineses, turcos, indianos, russos. Copacabana está sempre cheia deles. Muitas vezes eu mesmo me sinto um turista em Copacabana. Talvez por não ser daqui. É, taí uma boa razão para que eu me sinta assim.

A TV da casa de sucos está sempre ligada. Não importa muito o que está passando. Às vezes é um campeonato de poquer, às vezes é um jogo de futebol e às vezes é um cardápio em slide show dos sanduíches e refeições que eles oferecem.

O rádio do restaurante ao lado é quase um alto falante. O lugar está lotado e as pessoas precisam falar mais alto para que sejam entendidas. Isso tudo forma um emaranhado imcompreensível de vozes, misturadas com o barulho dos ônibus e dos carros.

Entramos na livraria. Certos discos e livros possuem um certo magnetismo. É impossível sair da frente de alguns até que você decida comprar.

Naquele momento, eu estava entre a biografia de Keith Richards e a do Chacal. Levei o segundo. Certos livros tem magnetismo.

Enquanto olhávamos a seção de CDs, meu amigo comentava sobre essa onda de reprocessar, reconstruir, desconstruir um clássico, a sensação é a de que ocorreu uma dobra no tempo e aquele disco você acha que poderia ter sido gravado ontem. Você vai ao passado e volta ao presente em cada nota. Respondi que sim e meu amigo saiu para fumar.

Continuei ali em pé. A livraria também tinha uma TV ligada. Parece que todo lugar deve ter uma TV ligada. Um velho assistia com atenção as notícias.

Comentei com o meu amigo sobre a regravação que o Beck fez do primeiro do Velvet, lembrei também do Dougal Reed e a reinvenção do Rumours do Fleetwood Mac e o que o Flaming Lips fez com o Dark Side of The Moon, que deve ser o disco mais reprocessado da história. O pessoal do Easy Star reprocessou em dub, fizeram a mesma coisa com o Ok Computer do Radiohead e o Sgt. Peppers dos Beatles. Parece aquela história do Borges em que um sujeito reescreve todo o Dom Quixote linha por linha e no final não é o mesmo disco, ou melhor, livro. Não tem uma história dessa?

Andar. Circular. Ler e reler, ver e rever, ouvir e reouvir a história do rock.
i love rock and roll.

Eu estava pensando em todas essas coisas. O meu amigo perguntou sobre um livro que eu tinha comentando com ele, mas esqueceu o nome. Também não consegui lembrar. Vejo um homem que examina disco por disco da loja.

Alguma coisa. Alguma coisa existe nessa onda. Alguma coisa existe nessa onda de vinil que nos deixa realmente presos ao passado. Eu mexia e remexia os discos e sempre dava de cara com alguma coisa interessante.

Antigamente (antigamente, haha.) a sensação de estar dentro da Modern Sound era a de estar em um parque temático. Tamanha era a alegria de poder olhar todos aqueles discos reunidos. A História da Música Universal ao alcance das mãos, e na maioria das vezes, fora do alcance do bolso.

Hoje, a sensação é a de estar em um museu. Toda a discografia do Jethro Tull, Eric Clapton, Free, Tangerine Dream, Frank Zappa, Miles Davis, Charles Mingus, Lee Scratch Perry...penso em qualquer artista, é bem capaz de se encontrar por lá em uma nova edição, ou em uma caixa luxuosa. Coisas que só a Modern Sound tem, ou tinha, agora que vai fechar. Nunca existiu uma loja como a Modern Sound.

Na Modern Sound permanecem aqueles mesmos códigos para os discos: "D1-Importado", "LX2-Nacional", "F-Lançamento Nacional"...coisas assim, não decorei exatamente os códigos, até porque para saber o valor é preciso consultar a tabela correspondente de cada letra e depois...enfim, um sistema arcaico, e aparentemente bem sucedido.

Pensei em levar algum CD como uma memória afetiva, e fiquei com o "Sweetheart of the Rodeo" dos Byrds em mãos. Estava uma "bagatela" de 65 reais, (era o LX2 ou algo que o valha). Em algum momento, lembrei do meu amigo que disse ter conseguido em outra loja por 20, ou 15 reais e acabei desistindo da aquisição, depois eu gravo, ou baixo de algum rapidshare da vida, sei lá.

Saímos da loja e a rua estava silenciosa. Chovia um pouco.

3 comentários:

paoleb disse...

pelo menos o fim da modern sound nos deu este post! eu nunca coseguia comprar nada lá, os preços eram exorbitantes. queria uma edição mega luxuosa do are you experienced mas não rolou...

Expedito Paz disse...

Moro em Recife, mas vou ao Rio pelo menos uma vez por ano, e sempre gostei de ir na Modern Sound. A imagem que sempre fica da loja pra mim é de algum tiozão pegando pilhas de CDs de progressivo ou rock clássico pra ouvir e, eventualmente, comprar. Pena que pro estilo que eu gosto mais, que é rock/pop dos 80/começo dos 90, o acervo da loja não fosse tão bom. E quando achava algo, o preço era exorbitante. Resultado: nunca comprei um cd sequer lá.

Mas que a loja feche em paz e faça uma megaliquidação antes de dar o último suspiro.

Luiz disse...

Já vai tarde. A Modern Sound era uma das lojas com os vendeores e atendentes mais hostis e mal educados da história comercial do Rio, Brasil, América do Sul e do mundo.